9.6.12

UM SONHO DE HEITHA

Havia muito tempo que não sonhava com as grandes águas,
não sei porque,
acho que saudade de casa.

O sol já havia ido dormir e as estrelas bringavam de piscar os olhos para qualquer um que se atrevesse a levantar a cabeça.

Os anos haviam sido difíceis, estranhos e amargurados.
Dormi atras do sonho dourado dos seus olhos, correndo no campo de trigo.

Na última colheita perdi a lembrança do sorriso e me aprofundei na terra. A caça havia fugido, os moluscos e cogumelos não tinham o mesmo sabor de antes, a tenda havia sido rasgada e suas folhas espalhadas ao vento. Foi o tempo da terra, sem sol, da mágoa e da tristeza.

Sonhei,
uma grande pedra saia da água grande, não havia bravurra, não havia tormenta,
havia calda e paz,
senti o gelo como agulha nos meus pés.

Será que a grande mãe havia se enfurecido comigo?
Ví a sua raiz, como se pudesse entrar por debaixo dela e ela não me esmagaria.
A grande rocha branca, profunda, leve, suave e translúcida.
Havia luz alí e o céu tinha mudado de lugar.

Não senti mais frio,
não senti mais nada.
Girava suavemente abaixo da rocha, da grande rocha.

Quando abri os olhos, o sol ainda dormia,
mas eu sabia que era tempo de mudanças,
de criar raizes mansas, sem guerra.
De lavar minhas lágrimas e meus pesadelos.
Era hora de germinar e de colher, de ser colhida.

Quando os primeiros rais de sol acordaram os campos,
afiei o facão na rocha avermelhada e decidi não acender o fogo,
cortei um pedaço do velho carvalho caído e fiz um cajado, tosco, mas perfeito.

Os anos haviam se passado e já não era mais uma menina.
Senti um cheiro único de umidade e sal,
a grande mãe branca me guiaria.

Um sonho, minha estrada,
senti a vida de novo em mim.
um leve toque do vento, uma direção, um sentido.
Agora tinha de confiar.
Partir e começar.

Sabia que faria isso sozinha,
mas sabia que não estava só.

romí zerafim

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